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sexta-feira, outubro 17, 2008

As “novas tribos” do futebol






No caso do futebol profissional o ‘marketing’ inovador enquanto técnica está a dar os primeiros passos de forma segura e competente.

Um dos traços mais distintivos das sociedades modernas actuais é o da existência de grupos de pessoas, amiúde assaz heterogéneas, que partilham emoções e paixões. Mais importante, esta partilha traduz-se na existência de comportamentos vividos de forma comum.

As tribos das sociedades modernas resultam da canalização da emoção e da paixão para algum tipo de actividade, geralmente associada a uma forma de ocupação de tempos livres. Um conjunto de rituais (uma águia que plana e aterra antes de cada jogo sobre um pedaço de carne crua), quais tripas de borrego que um sacerdote pagão romano inspeccionava antes de grandes momentos políticos ou militares. Com lugares de culto (estádios, recintos desportivos, pavilhões), objectos de culto, hinos e ídolos, numa “parafernália” que em nada fica a dever a qualquer culto ou seita religiosa.

No caso do futebol profissional o ‘marketing’ enquanto técnica está a dar os primeiros passos de forma segura e competente. Talvez o que distinga esta actividade económica de outras seja o facto de os clientes a não reconhecerem enquanto tal. Emoção e paixão são forças dominantes, levando a que os adeptos não raras vezes pertençam a tribos alinhadas com os grandes clubes profissionais de futebol. Verdade se diga, que no passado presidentes de agremiações desportivas, dirigentes de clubes de futebol e por vezes atletas, já utilizavam algumas técnicas do ‘marketing’, conquanto estas fossem a mais das vezes não articuladas e desprovidas de intento estratégico. O que caracteriza a recente interpenetração do ‘marketing’ com o desporto profissional, em mercados que não os dos Estados Unidos da América do Norte, é o seu carácter metódico, o seu rigor e os resultados que consegue. Ao ponto de cada vez mais os clubes de futebol dedicarem uma relevância de gestão crucial ao ‘marketing’, quase ao nível da atenção que dedicam à gestão desportiva. De facto, uma função de ‘marketing’ forte e consistente é entendida em muitos clubes profissionais como condição indispensável ao progresso de clubes ou de sociedades. Os exemplos do Real Madrid ou do Manchester United são, a nível internacional, exemplos do que acaba de ser afirmado. Atente-se um pouco em algumas realidades: a) possuem adeptos não apenas nos países de origem e nas regiões circundantes às cidades onde estão baseados mas em todo o mundo, com especial destaque para o Continente Americano e a Ásia; b) os adeptos dos países de origem, “nacionais”, estão focalizados no desempenho desportivo e a sua lealdade é para com o clube; c) pagam quotas de sócios e compram bilhetes de época e ainda algum ‘merchandising’; d) os adeptos internacionais estão mais interessados num jogo esteticamente belo, mais fiéis aos jogadores bonitos e com carisma internacional que ao clube; e) consomem principalmente direitos televisivos e camisolas; f) para além dos adeptos ainda existem os patrocinadores que buscam associar-se a emblemas desportivos prestigiados, de penetração em múltiplos mercados, vencedores.

Dois exemplos apenas ilustram a importância do ‘marketing’ neste dois potentados:

- a conferência de apresentação, feita às 11 horas de Madrid de David Beckam, aquando da transferência de Manchester para o Real Madrid, foi, até à época, o segundo evento mais televisionado à escala mundial;

- o Instituto de Turismo da Malásia anuncia um patrocínio de três anos com o Manchester United, preterindo o Chelsea, pois o United tem maior projecção e adeptos que os ‘blues’ londrinos.

Em suma, os grandes clubes profissionais de futebol são muito mais que agremiações desportivas. Cotadas ou não em bolsa e dispondo de vultuosos orçamentos anuais, o desempenho desportivo é relevante mas não o único objectivo. Captar patrocinadores, negociar novos e acrescidos direitos televisivos ou de ‘merchandising’, digressões ao Extremo Oriente, entre outros, passam a ser metas instrumentais de relevo e de ‘marketing’.

Artigo publicado no DE, dia 2/2/2007

1 comentário:

Anónimo disse...

Caro Prof Bruno Cota,
Concordo em absoluto com a reflexão sobre a importância crescente e nalguns casos "crítica" para o sucesso empresarial de certas modalidades desportivas. Certo tipo de desporto e muitas empresas desportivas (clubes do ponto de vista da paixão) produzem actualmente grande parte dos seus resultados através da intervenção do Marketing. Escolas de Negócios em todo o mundo começam a dar especial relevo à importância do Marketing no Desporto não por alguém tenha "engraçado" com esta parceria mas porque alguém percebeu que objectivamente é uma estratégia altamente lucrativa, por vezes mais do que os resultados operacionais decorrente do "core business" dessas empresas. Qual o segredo desta estratégia? Simplesmente as EMOÇÕES. Uma vez um amigo disse-me com especial emoção e entusiasmo: “ vou comprar um bilhete de época ..!” Perguntei: Como é possível que apesar do clube X perder quase sempre ainda insistes em gastar dinheiro? Como se resolve este paradoxo? Ele respondeu: Olha eu e os muitos outros compramos o bilhete de época e acções do clube não por decisão racional mas por emoção e paixão. Percebi! São investimentos que não podem ser avaliados numa óptica racional. O que se passa hoje com o desporto em geral mas não só, e em particular com o futebol é que alguém percebeu que pode explorar a sinergia de ambientes onde as emoções estão “à flor da pele” e concomitantemente aproveitar esses estados emocionais para reter de forma especial informação sobre empresas, produtos, e serviços. Eduardo Punset diz que a alma está no cérebro. Os estados emocionais alimentam essa “alma” de forma particular. Por definição, a emoção é uma resposta que envolve diferentes componentes, nomeadamente uma reacção observável, uma excitação fisiológica, uma interpretação cognitiva e uma experiência subjectiva. O marketing no desporto pretende sobretudo actuar nas emoções desencadeando “uma interpretação cognitiva positiva e favorável”. Os ambientes desportivos e designadamente o futebol permitem incubar paixões e emoções de carácter único, e o Marketing desportivo considera que esse ambiente é altamente favorável à formação de opinião. É fundamental que as empresas percebam que o consumo também se faz por via da experiência emocional. O futebol não precisa de criar condições para isso, porque um estádio de futebol lotado, um jogo de futebol, o próprio ambiente do futebol, constituem experiências per si de grande carga emocional. O marketing ao serviço do desporto (ou eventualmente ao contrário) já percebeu isso. A emoções são estados “quentes” e o futebol é uma óptima “caldeira" para as empresas desportivas e outras ganharem dinheiro, muito dinheiro, através de uma boa campanha de marketing. Enfim como alguém disse: “ A sabedoria manifesta-se na obtenção dos melhores fins com recursos aos melhores meios” .