Uma marca de raiz para fundir culturas muito distintas
Uma vale mais de mil milhões. Outra 633 milhões. São as melhores na qualidade do atendimento, ditam os clientes. Estão no "top of mind". E juntas? Só com uma nova marca de raiz
"Uma marca é uma história metafórica que está sempre a evoluir." Se a fusão entre o Millennium bcp e o BPI se concretizar, deverá ser criada uma marca única, conforme a estratégia que ambas as entidades seguiram até agora.
A frase citada é do autor Scott Bedbury. Quem a cita é Bruno Valverde Cota. Este especialista em "marketing" defende, a par de Lourenço Lucena, director da consultora Blug, a criação de uma marca bancária de raiz.
"Tratam-se de empresas com marcas, identidades visuais e culturas muito distintas. Do meu ponto de vista, caso aconteça uma fusão, deverá ser criada uma nova marca de raiz que substitua as outras duas.
Uma marca que materialize uma nova ambição. Uma refundação à semelhança do que fez o Millennium bcp e o próprio BPI", comenta Lourenço Lucena.
"Afinal, numa área competitiva como é a banca, ter uma marca forte é um factor crítico de sucesso", acrescenta Bruno Valverde Cota, "academic membership" do Marketing Science Institute. "Mas, quando ambas as insígnias são fortes, será que uma fusão não destruirá as mais valias de cada uma?", questiona.
Clientes satisfeitos
"São as duas marcas bancárias protagonistas das maiores mudanças em Portugal. Foram as primeiras a sofrer alterações na imagem corporativa", aponta o académico. São, também, as duas insígnias com maiores índices de satisfação no que respeita à qualidade de atendimento, sublinha Bruno Valverde Cota.
De acordo com os dados acumulados de Janeiro a Agosto do Basef, o BPI apresenta o índice de satisfação mais elevado (85,7%) por parte dos clientes. Segue-se o Millennium bcp, com 80,2%. Em terceiro lugar aparece o BES, com 76,6%.
As duas insígnias bancárias apresentam também elevados níveis de recordação genérica de marcas. Segundo os dados acumulados de 2006 da Publivaga, Marktest, o Millennium bcp surge em 10° e o BPI em 14°.
Neste "ranking", o BES lidera na 6ª posição. Já marcas como a CGD e o Totta aparecem em 35° e 57° lugares, respectivamente.
Forças e fraquezas do BCP...
E o que diferencia o Millennium bcp? Onde está a sua força? "É uma marca muito valiosa. Impôs-se depois da sua unificação, naquela que foi uma das estratégias de 'rebranding' melhor conseguidas a nível europeu", considera Lourenço Lucena. Goste-se ou não, todos reconhecem a marca", salienta.
"Representa solidez, exprime uma forte presença no mercado, tem capacidade de internacionalização e uma forte preocupação no desenvolvimento de acções para os colaboradores", atira Bruno Valverde Cota.
De acordo com Lourenço Lucena, a força do Millennium bcp "ficou, pelo menos numa primeira fase, danificada com a saída atribulada de Paulo Teixeira Pinto e os acontecimentos que se sucederam". Bruno Valverde Cota considera que o banco de Jardim Gonçalves perdeu o controlo da agenda de comunicação, o que terá revelado ineficiências em termos de gestão de crise.
... e do BPI
Nesta crise, a imagem do líder do BPI, Fernando Ulrich, saiu reforçada. Ou esse não fosse um ponto forte da marca do banco: a força do seu líder. É isso que defende Lourenço Lucena. "Qual a melhor prova do que este último ano e meio?", questiona. "E não nos podemos esquecer de que as instituições e as marcas são seres vivos. São o reflexo das suas lideranças", salienta. "Com este líder o BPI passa uma imagem de tranquilidade e segurança", diz.
Em relação a fraquezas, os dois especialistas em "marketing" apontam factores como a menor dimensão do banco e o menor valor da sua marca.
Millennium bcp e a aposta na marca única
Em 2003, o grupo BCP abandonou as marcas comerciais Nova Rede, Atlântico, Sotto Mayor e BCP, apostando na designação única Millennium bcp, a marca que a instituição tinha na Polónia. "A palavra BCP era fortíssima em Portugal mas não funcionava no estrangeiro. Já Millennium bcp era inteligível em diversas línguas, exprimindo universalidade. Mas, sozinha, remetia para áreas não bancarias", referia, num estudo de marca, Paulo Fidalgo, director de comunicação do grupo BCP.
Resolução? A marca única Millennium bcp. "Millennium", uma palavra com origem latina, é "emocionalmente forte". Já a cor púrpura exprimia uma ruptura com o passado. Mas não totalmente.
A linha cromática é a mesma de sempre e a marca histórica BCP ficou como marca de "endorsement", dando continuidade às faixas bcp existentes nas sucursais. BPI e a flor de laranjeira das quatro pétalas
O Banco BPI nasce em 1998, em resultado da fusão de quatro bancos, o Banco Fonsecas & Burnay, o Banco de Fomento e Exterior e o Banco Borges & Irmão, tendo também sido absorvido, no final desse ano, o Banco Universo, um banco "in-store".
BPI herdou o nome e a cultura do Banco Português de Investimento. Com ele nasceu uma nova imagem. Que pretendia combinar dois atributos: a experiência, reflectida na tipografia e no tom sóbrio do nome BPI, e a harmonia, representada através da cor e do motivo: a flor de laranjeira.
"Em muitas regiões da bacia mediterrânica e do Cáucaso, laranja diz-se com o nome de Portugal, num inesperado vestígio com a história dos Descobrimentos", referia a instituição. "A laranja sugere calor, cordialidade e acolhimento. À flor de laranjeira foi retirada a quinta pétala para se adequar ao número de bancos."
Clientes do BPI são os críticos mais severos do BCP
A marca Millennium bcp vale 1,118 milhões de euros, a flor de laranjeira do BPI tem um capital de 633 milhões. O banco de Jardim Gonçalves está actualmente na segunda posição do "ranking" das marcas nacionais mais valiosas elaborado pela consultora Interbrand.
O BCP perdeu o primeiro lugar para a Caixa Geral de Depósitos, o BPI galgou um degrau subindo para a sexta posição.
Mesmo tendo perdido uma posição, o BCP tem motivos para sorrir De acordo com um estudo encomendado pelo banco à Interbrand, o Millennium é a instituição bancária nacional que, em termos gerais, mais pontua em termos de reputação de marca. Na lista, segue-se o BPI.
Mas os dados mudam de figura quando se analisam as respostas dos clientes de cada banco. Os "consumidores" BPI atribuem ao seu banco uma reputação superior àquela que os clientes BCP atribuem ao banco de Jardim Gonçalves. Mais ainda: os clientes BPI são os mais duros a avaliar a performance do BCP em termos de reputação, de performance económico-financeira, visão e
liderança, qualidade de serviço ao cliente, qualidade de produtos e serviços, qualidade ao nível de taxas de juro e comissões, responsabilidade social e ainda a pior pontuação em termos de ética, cultura de gestão e governo societário.
Ou seja, no estudo encomendado pelo BCP à Interbrand em Dezembro de 2006, ao qual o Jornal de Negócios teve acesso, o banco de Jardim Gonçalves ficou a saber que os clientes do BPI são actualmente os seus críticos mais severos.
E se houver fusão?
Uma marca avaliada em 1,118 milhões de euros une-se a uma outra avaliada em 633 milhões de euros. Valerá esta união 1,751 mil milhões de euros? Não necessariamente.
Num cenário hipotético de fusão entre o Millennium bcp e o BPI, em que apenas uma das marcas sobreviveria ou uma terceira seria criada de raiz, o resultado dificilmente seria a soma das duas partes.
Segundo cenário: após a fusão, a nova entidade bancária opta por manter as duas marcas podendo, por exemplo, redireccioná-las para segmentos distintos. A estratégia poderia ser vencedora. Ou seja, o valor de cada uma das insígnias poderia até aumentar.
Os cenários são "hipotéticos", realça Alexandre Zogbi, director de avaliação de marcas da Interbrand, mas permitem explicar que, à luz dos "rankings" anuais elaborados pela consultora, o valor de cada marca é o somatório do seu capital junto do público e dos resultados financeiros da respectiva empresa. "Uma visão macroscópica", diz Zogbi.
Ou seja, num cenário de fusão é expectável que o valor das duas marcas aumente ao beneficiar da "paternidade" de uma instituição bancária financeiramente mais forte.
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